quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

batalha das galinhas (Operação Galo Fino)



A tempos estávamos tentando pegar Argemiro, mas nunca conseguíamos muita coisa.  O cara estava sempre metido em rolo, mas o máximo que conseguíamos era fazer alguns TCs (Termos circunstanciados), por Dano, Ameaça, Injúria, alguma lesão corporal leve. Ele passava aprontando e era temido na cidade, pois, tinha fama de machão, brigador, sempre que mandávamos os TCs pro Foro, ele ameaçava as vitimas e testemunhas; e acabava saindo de lombo liso. Por fim por medo dele, muitos nem registravam ocorrência.
Era grande a conversa na cidade de estar metido em abigeato, vender carne para bolichos no interior e até para algum mercado na cidade, e até um caminhão boiadeiro havia comprado a pouco, o que aumentava mais as suspeitas; além de comentários de trazer drogas de fora da cidade.
Já que apesar das conversas de esquina, ninguém botava isso no papel. Conseguimos alguns informações anonimas e pedimos uma escuta. Mais de mês ouvindo ligações para as amantes, marcando encontros, esquemas e orgias. Chegava a estar com uma irmã, e cantar a outra, era um cara de pau o tal do Argemiro.
Mas de produtivo muito pouco, o cara era esperto, para negócios mais arriscados ou tinha outro telefone, ou falava pessoalmente. A única coisa que pegamos foi ele combinar de fazer uma rinha de galo em sua propriedade. Já era alguma coisa. Sabendo da rinha, podíamos bater na casa dele, e pegar alguma droga, ou arma para fazer o flagrante. A colega que estava com a escuta falou com o delegado, e foi marcada a operação para o dia da rinha, “Operação Galo Fino”.
Então num domingão de sol a pino, saímos eu e a colega, bem cedo. Ficaríamos de campana, observando as pessoas chegarem na propriedade, depois, nos encontraríamos com o restante da equipe para “estourar” a rinha.
Tivemos que subir um cerro bagual, e ficar em cima de uma pedra, debaixo de solaço gaúcho, para podermos observar de binóculos a movimentação na propriedade.  Ficamos mais de hora lá, vestidos de preto dos pés  cabeça (vestimenta operacional) torrando no sol,  para ver meia duzia de carros passar. Pela escuta parecia que a rinha ia ser grande, mais de 100 pessoas, mas pelo visto algo deu errado, pouca movimentação. Mas mesmo assim, nos encontramos com o restante do pessoal, haviam umas 20 viaturas, mais de 50 Papa Charlies. Fiquei na equipe do fundão, em qualquer operação é indispensável “fazer o fundo”. Aprendi isso com um delegado antigo. E realmente nesses casos sempre tem algum vago que foge pelos fundos, e se não fizer o fundo, alguém acaba escapando.
As viaturas saíram e lá fui eu mais três atravessar um mato de eucalipto bem espeço, passar uma “sanga”, depois subir uma “coxilha” para chegar a propriedade. Mal chegamos no alto, e começou “Tau”, “Tau”. “Tau” (tiros). Atrás daquele eucalipto não tinha com saber quem estava atirando, muito menos de onde. Aceleramos o passo, mas com cuidado andando em torno do mato, até que começamos a avistar um bando de gente correndo, alguns virando em perna, descendo um barranco pro outro lado, e outros vindos em nossa direção. Não sabíamos se estavam armados ou não. Atirar ou não atirar? Na duvida, prefiro sempre não atirar, melhor esperar que matar um inocente. Passa um fujão na minha frente, mando parar; não para. Grito de novo. Nada. Só parou quando dei um tiro próximo dos pés dele. Se não vai na educação, vai no susto. Deixo este sob custodia do colega que vem de trás, pois já estava vendo outra figura conhecida logo adiante. É Argemiro fugindo com carregando algo nas mãos. Grito: -Levanta as mãos, levanta as mãos!. E ele: - Não posso, se não os galo briga. Quase não me contive quando avistei direito a cena. Ele com um galo em cada mão, e não queria soltá-los no chão para não brigarem. Que peça rara....
Dei voz de prisão, e os colegas de trás chegaram, até que avistamos aquele outro bando, uns correndo e outros rolando morro abaixo, e alguns colegas atrás. Deixei Argemiro com os colegas, e lá me fui. Sai já uns 500 metros atrás, mas acelerei, deixando cair minha perneira, que impedia que corresse direito. Esse é o problema de se encher de badulaque tático, se precisar correr, não tem como.
Cheguei junto de dois outros policias que já estavam em volta de um banhado onde uns três outra quatro, haviam e escondido. Batemos os matos, mas muita gente já tinha se evadido do local. Avistei um mais a cima, e sai correndo atrás, já estava se folego, e quando me aproximava ele corria, e assim fomos, até que ele pegou uma motocicleta que estava atrás de uma árvore e se mandou (assim não vale). Resolvi voltar, e na passada, ouvi uma voz dizendo, eu me rendo não atira. Até que mais um saiu do mato com as mãos pra cima. Pegamos uns três no mato, mas muitos fugiram, e retornamos sujos, suados, embarrados, para agrupar com o restante do pessoal. Ao reunir vimos o saldo da ação, 20 presos, a maioria pessoas idosas, pois, quem conseguiu correr fugiu. Pegamos algumas armas sem registro, muitos artefatos para rinha de galo, além de mais de 100 galos.
Na DP juntamos fizemos o flagrante, e enquanto isso eu custodiava os velhinhos da outra sala. O mais engraçado foi ouvir um dizer: - Que, que eu vou fazer agora? To velho, já não posso joga bola, namora não consigo mais, agora nem brinca de rinha posso mais.
Nesse dia foi isso, muita correria, troca de tiros, mas pelo menos conseguimos desmanchar a rinha. Pior foram os dias que se seguiram, operação acabada. Quem iria carregar todos aqueles galos? Eu e meus colegas. Alguns galos estavam em armários, grandes de madeira, mais de 20 galos em cada, e outros em gaiolas menores. E pior o caminhão da prefeitura que conseguimos era de transportar areia, não baixava a carroceria. Os galos que estavam nas gaiolas avulsas, tivemos que pegar, e atar as pernas e colocar no caminhão. Fora algumas bicadas nas mãos, não foi tão difícil. O pior ainda estava por vir, ainda tínhamos que erguer aqueles armários pesadíssimos, para cima do caminhão. O jeito foi erguer a muque e colocar no caminhão (aí se foi meu ciático). Quando pensava que o trabalho estava acabado, disse o delegado. Temos que pegar as matrizes também. Matrizes? Me aponta ele umas 10 galinhas, magrinhas, irmã gemeá de saracura, que estavam soltas num terreiro próximo. E quem disse que pegávamos? Eramos em 5 mais ou menos, eu, outro colega, o motorista, e dois operários da prefeitura, correndo feito uns tontos para pegar aqueles bichos, mil vezes mais rápidos e ágeis do que nós (cena tipo coiote e papa-léguas), e naquele momento acredito que até espertos, pois, parecíamos uns idiotas correndo atrás das galinhas, foi tombo pra tudo que é lado.  E o velho Maneco, pai do Argemiro, de braços cruzados, dando gaitadas da cena que via. Cinco barbados se estabacando para pegar umas galinhazinhas. Tanto nos viu sofrer, sem muito exito, que decidiu ajudar, e como é gaúcho da lida do campo, bem fácil pegou as bichinhas. Tem coisa para as quais diploma universitário não te serve de nada, uma delas é pegar galinha a unha, a outra é abrir porteira (mas essas são outras conversas...).
 Findada a batalha das galinhas, levamos o bicharedo para outra propriedade, onde ficariam até  a decisão judicial. Quer dizer deixamos os galos vivos, pois, no caminho, em cima do caminhão, muito brigaram, se machucaram e alguns morreram. Oh! bicho tinhoso o tal galo de rinha. Não da pra botar dois juntos que brigam, não sei se pela natureza ou pelo treinamento. Mas enfim foi esse o saldo, 20 velhinhos respondendo por crueldade contra os animais, Argemiro ficou preso por uns dias, aquela rinha acabou, e dentre penas e bicadas, quase todo mundo saiu ileso, com exceção dos galos, que conforme soube, após terem sido entregues a outro criador, acabaram virando rizoto.

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